sábado, 19 de setembro de 2009

Esta noite um sonho

Esta noite, algumas reflexões se fizeram presentes na minha mente, ao ponto de ter sentido, mais uma vez, a necessidade de as por no papel. Neste caso, um papel virtual. Mas vamos ao ponto. Era Leonardo Boff na televisão, no programa Sempre um Papo, da TV Câmara. Dizia o teólogo franciscano, a quem vi quando veio em João Pessoa muito tempo atrás, que o pão é tão importante quanto o Pai, e convidava, nesse eixo de discussão, os irmãos carismáticos, --assim os chamou—a unirem suas danças e cânticos –o Pai há de ser sempre louvado, lembrou—a um trabalho em prol do pão, com os pobres. A comunhão com os ricos é fácil, disse, mas não o é a comunhão, a comunidade com os pobres. O cristianismo, afirmou, tem de novidade isso: não a transcendência, mas a transdescendência. Fez um movimento com as mãos para baixo, como descendo uma escada, os degraus de uma pirâmide. Comungar com os ricos, com os empresários, com os que tem, é muito fácil. Lembrava da necessidade de se unir, nesta caminhada para baixo, saber acadêmico e popular. Pensei na terapia comunitária, que faz isso, fazemos isso, pois que há já vários anos ando nessa estrada, e recentemente tenho participado do Congresso Brasileiro de Terapia Comunitária em Beberibe e nas Ocas do índio, no Ceará. Pensei que a teologia da libertação –e isto poderá ser corrigido por quem quiser ou puder ou souber—enuncia uma libertação eu a terapia comunitária executa, põe em prática, mas de modo concreto, não ideológico, não confissional. Enquanto via o teólogo franciscano, com essa hombriedade de bem que o distingue, essa naturalidade da pessoa que fala do coração, sem enfeites nem ânimo de agradar a ninguém, pensava, como foi bom ter chegado a este porto. Porto Brasil, Porto Paraíba, Porto terapia comunitária. Porto Barreto, e aqui vem os Barreto em bloco. Adalberto Barreto, o fundador da TC, Ailton, animador e co-fundador, desde seu trabalho no Projeto 4 varas, daonde nasceu esta teia eu hoje se expande pelo Brasil inteiro e para a América Hispânica. Os pobres devem se unir, dizia Leonardo Boff na entrevista que comento. Eles se unem nas rodas da terapia, unindo saber popular e científico, como Paulo Freire e seu movimento de educação popular ensinou a ensinar, ensinou a aprender. A vida da muitas voltas todos sabemos. Paulo Freire era um dos inspiradores da transformação do curriculum da faculdade de sociologia onde me formei. Isto é, onde comecei meus estudos, interrompidos pelo golpe militar de 1976, terminando em 1987, após a anistia decretada pelo governo de Raúl Alfonsín. A vida deu muitas voltas, de verdade. Naquela hora, nesses anos todos da diáspora, parecia que tudo tinha acabado. Que apenas restava o neoliberalismo como horizonte de vida. Mas essas voltas da vida me trouxeram para estas praias onde o mar arrulha dia e noite, os pássaros cantam e os grilos e cigarras embalam o sono. E aquele sonho de muitos, um sonho verdadeiramente de pão para todos e de um Pai ou uma Mãe, pois creio ser Deus isto, Pai e Mãe, um Deus para todos, sem ideologias nem sectarismos, um Deus de amor numa comunidade de irmãos e irmãs, numa comunidade que se reconhece filha de um ser superior que a todos nos quer por igual, sem distinções, esse sonho vive e se expande, se multiplica a cada dia, de muitas formas, por toda a parte. É sábado à noite, e não sei onde possas estar, num bar à beira mar tomando cerveja e comendo caranguejos, em casa vendo televisão ou num avião indo atrás de gente que amas ou a trabalho, e não pretendo te chatear com idologismos de nenhuma espécie. É apenas uma vontade de dizer, em alto e bom som: O sonho não acabou, o sonho vive e cada dia é mais sonhado por muitos e muitas pelo mundo afora, e a humanidade, como John Lennon canta em Imagine, é uma só.

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