quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Centramento

Ontem de noite, no fim de um dia agitado, vi umas palavras ordenadas em uma prateleira. Vejo elas agora, na lembrança. Palavras ordenadas umas ao lado das outras. As letras eram objetos físicos. Eu as via como coisas, como objetos materiais. No momento em que eu vi estas letras e palavras, vi uma palavra, e a senti: ordem. As palavras ordenam, as palavras constroem o mundo interior, o constituem e o vão moldando. Agora que escrevo isto, me vem uma sensação de paz e quietude, aquietamento. Às vezes perco a serenidade, por não estar olhando para dentro. O tempo atual é demasiadamente voltado para fora. Há que olhar para foram sem dúvida, mas o ser vem de dentro. Vem de dentro, vai para fora e volta para dentro, é um vai-vem. Ontem à noite, ou hoje de manhã, não lembro bem escrevi algumas palavras no caderno. Elas diziam respeito exatamente a isto, como as palavras nos descolam de uma realidade externa que muitas vezes nos des-centra. Podemos fazer o caminho inverso: olhar para dentro, para o ponto central dentro de cada um, de cada uma de nós, e ali encontrar o eixo fugidio da vida.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Direção

Solo le pido a Dios Que la reseca muerte no me encuentre Vacío y solo, sin haber hecho Lo suficiente. León Gieco Quando penso que tenho algum problema, lembro: estou vivo. Nenhuma vida humana é um mar de rosas. Todos nós temos dificuldades, desafios. A vida é uma construção contínua, um contínuo tentar abrir espaços para respirar melhor, para ser mais, para se expandir, ser feliz, crescer. Grandes dores e perdas geraram uma vontade redobrada de insistir no bem, uma fe reforçada, um querer alcançar as próprias metas, um querer prosseguir no esforço por se unificar com a totalidade da vida.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Yendo y viniendo

A veces me pierdo un poco cuando voy demasiado a cosas lejanas, distantes, demasiado grandes o importantes, fuera de mi mundo y de mi alcance. Me pierdo pero vuelvo, tomo el caminho de regreso. Y entonces estoy otra vez en lo mío, en lo pequeño e imperceptible, en las cosas de todos los días.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Quando vem as cores

O chamado da cor. Quando as cores chamam, eu atendo. Atender o chamado das cores, é ir para um mundo silencioso, quieto, mas muito vivo. Um mundo de sentimento e memória. Esses dias atrás, tenho me recolhido a esta sensação, que vem quando fico em volta das cores. Dos papéis e pincéis. Das aquarelas e dos vidros com água. Um desses dias, fiquei a olhar os lápis de cor. Via o amarelo, o vermelho, o azul, o verde, o laranja. Sentia as cores, mais do que apenas as via. Esta sensação me dava uma paz muito grande. Botei um pouco de água em uma das folhas de papel, e vi a água sendo absorvida. Passei um verde e fui desenhando alguns traços, como se fosse uma pradaria, ou um mar. Acabou sendo um mar. Mas não me importava muito o que era, ou o que seria, e sim, o que estava sendo, e o que eu ia sentindo, ao ver o verde se espalhar, cobrir a folha, ocupar espaço. Depois pintei umas nuvens no céu, um azul celeste claro que ia se misturando com a água. Foi como se estivesse vendo todas as nuvens que vi na minha vida. Todos os céus que já vi na minha vida. O mar ficou encrespado e depois coberto de preto. Risquei a superfície, e apareceram linhas claras, mostrando a cor de baixo. Ficou lindo, em movimento. Não era algo que eu tivesse planejado, projetado. Não sabia o que iria desenhar ou pintar. Foi vindo, e eu curtindo esse vir das cores. Esse meu vir nas cores. Fiz um outro quadrinho, ou fui instrumento da sua feitura. Uma espécie de sol, laranja, vermelho e amarelo, muito tênue. Do mesmo modo. As cores do fundo, foram se misturando com as da base, criando como flores lilases ou roxas. Umas rosas não planejadas, que iam se formando ao sabor do movimento que misturava cores do céu e da terra ou da água. Não sabia o que era, apenas sentia a beleza das florezinhas que iam se formando. Quando vem as cores, um silêncio vem junto, um silêncio que te acolhe.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Realidade

Tem uma frase de Julio Cortázar em A volta ao dia em 80 mundos, que não deixa de vir a mim. É aquela em que o autor diz que a literatura desfaz a falsa objetividade criada pela inteligência raciocinante e pela cotidianidade codificada. Esta observação aparece dentro de um capítulo intitulado “Do sentimento de não estar totalmente.” Muitas vezes tenho meditado sobre isto, e tenho certeza de que continuarei a fazê-lo por muito tempo. Não é uma citação textual, mas é o que o autor me diz. É como se fosse se abrindo uma possibilidade de contato real com o que está aqui, não com o que aprendi a pensar que está aqui. Esse contato é a chave, pode ser a solução. O verdadeiro encontro com a realidade, não com a réplica arquivada na memória.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Mimos do céu

Essa tarde, estivera atrás de uma imagem de mimos do céu. Na verdade fazia mais tempo que queria encontrar essa imagem. Queria trazê-la para uma tela, fazer um quadro que enfeitasse a sala da casa. Mas não sabia ao certo, até hoje, se eram mesmo mimos do céu ou hortênsias. Hoje vira algumas imagens destas flores, que formam como uns ramalhetes tão tênues, que o vento mexe suavemente as pétalas. Fechara os olhos e vira as flores. Vinha uma sensação de muita paz, quietude. Lembrara de outras flores que a sua avô gostava. Vinha essa sensação de tanta tranquilidade. Pegara um pequeno floreiro que fora de Mamina, e ficara a olhá-lo. Contemplava o cristal talhado, os reflexos. Fizera alguns rascunhos. Continuo vendo essas flores agora, azul celeste claro. E é essa mesma sensação de paz, de tranquilidade. Não sei se verdadeiramente virei pintar esse quadro para a sala da casa. Talvez essas flores estejam em algum outro lugar. Mas o que vale é poder estar com essas flores outra vez, que te trazem mais perto, Mamina.

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Letras reversas

A veces uno trata de encontrar su lugar en el mundo, un lugar en el mundo, de distintas formas. Lo hace, por ejemplo, entre las letras, escribiendo o leyendo, escribiendo y leyendo. A veces más escribiendo que leyendo, a veces lo contrario, pero lo contrario no es lo que se opone, aunque puedas pensar lo contrario. Lo contrario, en este caso, es decir, más leyendo que escribiendo, es apenas una cuestión de matiz, porque si te fijás bien, leer y escribir son como que los dos lados de un vidrio. Si mirás desde aquí, lees, y si mirás desde allí, escribes. ¿Te das cuenta? Es muy lindo.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Vida é amor

Hoje está sendo um dia muito especial. O que um dia pode ter de tão especial? Hoje andava por uma das calçadas do meu bairro, e ficou claro para mim que a vida é amor. Que o amor é tudo na vida, e que tive amor durante toda minha vida, ainda quando pensei que não o tivesse tido. Ele estava ali, o amor estava ali, sempre esteve, e sempre estará, enquanto vida houver. De tarde, em um momento fiquei na sala. O tempo tinha parado. Quase não havia pensamentos. Quietude, paz. O amor é também quietude, justiça, paz. Fiquei apenas ciente de que estava ali, na sala, sentado, quase sem pensamentos. É como se a vida tivesse se recolhido por completo a esse momento. Depois, de noite, saí para caminhar de novo, por outras ruas do bairro. Vi as flores das casas de em frente. Amarelas, vermelhas, lilás. As pessoas no calçadão. Uma criancinha brincando com outra, perto da mureta que fica do lado do mar. Outra vez, pensei no amor, como a totalidade da vida, o que sustenta a vida, o que é a vida, senão amor. Foto: Crisântemos

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Alegria de ser

Há dias em que sentes uma alegria profunda. Não tem alegria maior do que a da gente ser quem a gente é. Vem pensamentos engraçados na tua cabeça e ris, simplesmente ris. Agora que registras isto, a alegria está contigo, mansa, uma quieta companhia. Deve ter sido assim quando eras criança, mas não tentas especular. Apenas ris, interiormente, ou com o corpo todo, ris. Deves ter tirado um peso de cima, ou muitos pesos, todos os pesos. Os pesos das funções, das identificações, das obrigações. Viver não é um fardo, não é uma carga. É um deixar-se ser, um deixar-se estar, um estar aqui, pleno, feliz, como estás. Não necessitas a toda hora estar te obrigando a fazer isto ou aquilo, ou a ir lá ou acolá, ou a estar de um modo ou de outro. Basta estar, basta ser. Já és o que deves ser, estás em paz, feliz.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Contención

Muchas veces, cuando alguna cosa me está enfermando de la cabeza, me voy a la literatura, o a la oración. Son mis refugios preferidos. Hoy a la mañana, bien temprano, cuando todavía no me había levantado, alguna enfermedad mental me empezó a merodear. No demoré, y le apliqué el remedio literario. Desapareció al instante. No es que me ponga a leer algún libro, necesariamente. No siempre se puede, ni siempre es necesario. Lo literario está ahí, al alcance de la mano. Así como la poesía y la oración. En el fondo, me parece que son un único y el mismo mundo. Literario, poético, espiritual. Dejé la mente vagar, pero con rumbo cierto, hacia las páginas de esos libros que ya no son algún libro determinado ni un cierto grupo de libros, sino el libro en sí, el libro de la existencia, el que vengo leyendo desde que me conozco por gente. Ese libro es una página que está ahí, al alcance de la mano, a toda hora. A veces es algún libro que he leído. Lugones, Borges, Cortázar, Lya Luft, Martha Medeiros, Cecília Meirelles, Gita Lazarte. Otras veces es el Martín Fierro, el Evangelio, Bécquer, y entonces veo que es un único libro, un libro que me contiene, que contiene todo lo que existe. La sensación que experimenté hoy de mañana y ahora que escribo estas cosas, es de una paz profunda. Es la propia eternidad.