domingo, 24 de janeiro de 2010

Marx, humanista

Na sociedade capitalista, segundo Marx, a vida torna-se um meio de vida, na medida em que se vive não por viver, mas se vive “para”. Eu não trabalho porque goste de atender o telefone, fazer programas de rádio ou escrever, mas porque fazendo isto, ganho dinheiro que me possibilita fazer o que eu quero. O dinheiro, o meio universal, se instala no meio de tudo e de todos.

O que ocorre com o dinheiro na vida diária, na vida de relação, ocorre com a lógica, “o dinheiro do espírito”, nas suas palavras. “A propriedade privada tornou-nos tão néscios e estúpidos—afirma—que uma coisa somente é nossa quando diretamente a possuímos, a comemos, bebemos, vestimos, usamos ou habitamos”. Ou seja, quando a usamos.(Manuscritos Econômico-Filosóficos de 1844. III Manuscrito: Dinheiro). “Todos os sentidos físicos e espirituais foram alienados ao único sentido de ter.” (…) “O homem tinha que ser reduzido a esta pobreza total, para dar a luz toda a sua riqueza interior”

Estas palavras de Marx sobre o ser humano na sociedade capitalista, nos levam a refletir sobre a vida em si e a vida como meio. Eu fico surpreso, uma criança fica surpresa, com a vida em si, ela me fascina, me surpreende, me admira e não me canso de me surpreender com o mero fato de estar vivo, de estar respirando, de estar num corpo, que esse corpo caminhe, ouça, veja, pense, sinta, queira, brigue, chore, ria.

Como já vivi um certo número de anos, considerável, me admira, como a todas as pessoas que já temos uma certa idade, o fato de ter passado por tantas experiências, desde a infância até hoje, em que a estação final se pressente muito mais próxima.

Tantas pessoas e lugares, tantos caminhos e livros, tantas falas e batalhas, tanto medo e tanta coragem, tanto de tudo para chegar aqui, a esta página em que você ali e eu aqui, dialogamos em silêncio.

Os textos de Marx sobre o ser humano na sociedade capitalista são um alerta contra a perda de sentido pela mercantilização da vida, pelo utilitarismo, pela mediatização. A vida que se torna meio de vida, perde-se enquanto vida em si.

Marx foi recuperado, nesta sua preocupação humanista, humanizante e humanizadora, por Agnes Heller, Wilhelm Reich, Max Weber, Erich Fromm, entre outros e outras. No seu túmulo no cemitério de Southampton, Inglaterra, podem ser lidas estas palavras: “Sou homem, e nada do humano me é alheio”.

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